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A Escolha da Alma-Gêmea


“Se está tudo por um triz

O que você prefere

Ter razão ou ser feliz?”

- Wado (2011)


Entre os muitos assuntos discutidos na filosofia, Platão coloca em discussão uma questão sobre a origem da humanidade, contando uma história pelas palavras de Aristófanes: O Mito do Andrógino.


Dizia o filósofo, que nos primórdios do mundo o homem não dispunha da estrutura física que se tem hoje. O homem era formado por um espesso tronco, com dois rostos em sua cabeça, quatro braços e quatro pernas, dois pares de orelhas, enfim, tinha tudo em dobro. Ao contrário do que se pode pensar, ao invés de lentos e desajeitados por sua forma, eles era muito ágeis, fortes e habilidosos, e num certo momento, resolveram empreitar uma grande escalada, com a finalidade de se conhecer a casa dos deuses. E conseguiram. Porém, ao chegarem lá, os deuses não gostaram nada da ideia, pois isso poderia colocar em questão a autonomia do homem e a vontade dos deuses. Então, Zeus cogita matar a todos os homens, e extingui-los do mundo. No entanto, não poderia fazê-lo, pois com isso perderia seus templos e seus fiéis. Resolveu então, como solução, cortá-los ao meio e alterar sua forma, colocando-os espalhados de volta no mundo; poderia com isso aplicar-lhes uma punição e ao mesmo tempo conseguir o dobro de fiéis. E assim o fez. Desde então, o homem anda errante na terra, com a esperança de encontrar sua metade de outrora.


Esse é um antigo mito grego.


A história contada questiona dois, dentre muitos aspectos: o amor exclusivo e o desamor, já que uma vez que se encontrasse a cara metade, isso deveria proporcionar uma alegria única e perpétua, e seria incapaz de se enfadar ou se afastar da presença do outro. E todos nós sabemos que isso não é verdade, pois na maioria dos casos, essa cara-metade pode mudar, desde a pré-escola até a aposentadoria. No entanto, hoje em dia esse mito ainda está muito presente no nosso cotidiano. Quem nunca ouviu a expressão “metade da laranja”, “tampa da panela”, “par de sapato”... podemos supor que essas expressões tenham surgido justamente da ideia exposta no Mito do Andrógino. E existem muitas pessoas que se envolvem em seus relacionamentos dessa forma, com um ideal de completude simbiótica muitas vezes exacerbado. É interessante que as pessoas se complementem, ou pelo menos se sintam assim, mas, como tudo na vida em excesso não faz bem, isso também não é diferente.


O fato é que cada um é uma pessoa diferente e independente, e precisa de seu espaço dentro de uma relação para poder crescer e amadurecer, caso contrário essa sensação de completude pode aos poucos sufocar cada um, e o que era agradável começa a se tornar incômodo. Acontece que às vezes as pessoas estão tão ligadas umas às outras, que quando se vêem numa situação de separação, tem-se a sensação de que se está perdendo realmente uma parte de si; logo, é comum que a pessoas sinta-se impulsionada à reparar o dano e recuperar a integridade da relação, o que nem sempre é recíproco, principalmente hoje em dia, onde as pessoas muitas vezes preferem mais algo novo do que consertar algo. Isso pode ser fruto do pensamento pós-moderno que sustenta mais a ideia de substituição do que a de reparação, visando produção e consumo, e é natural que isso passe a afetar várias esferas da nossas vidas, inclusive a conjugal. Junto a tudo isso, temos ainda inúmeras formas de comunicação entre tantas outras pessoas interessadas (ou não) em se relacionar, através de aplicativos, sites de relacionamentos, entre outros, que sustentam de certa forma essa ideia.


O importante é que cada um saiba de si. Saiba refletir até onde vale a pena reparar sua relação, e até onde é mais viável seguir adiante, pois a final de contas, ao contrário do mito, ninguém nasceu “colado” com ninguém, e somos todos livres para tomar decisões e escolher o par de sapato que lhe couber. E não importa se é um salto fino com um chinelo, um coturno com uma sapatilha ou um tênis de cada cor; o importante é que você possa ser feliz e sentir-se bem com a companhia que escolheu.


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​© 2016 por Davidson Rodrigues 



 

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